Estátua de Firmino Teixeira do Amaral na Central
de Artesanato Mestre Dezinho, em Teresina.
Literatura de cordel
também conhecida no Brasil como folheto,
é um gênero literário popular escrito frequentemente na
forma rimada, originado em relatos orais e depois impresso em folhetos.
Remonta ao século XVI, quando o Renascimento
popularizou a impressão de relatos orais, e mantém-se uma
forma literária popular no Brasil. O nome tem origem na forma como
tradicionalmente os folhetos eram expostos para venda, pendurados em cordas, cordéis ou barbantes em Portugal.
No Nordeste do Brasil o nome foi herdado, mas a tradição
do barbante não se perpetuou: o folheto brasileiro pode ou não estar exposto em
barbantes. Alguns poemas são ilustrados com xilogravuras,
também usadas nas capas. As estrofes mais comuns são as de dez, oito ou seis
versos. Os autores, ou cordelistas, recitam esses versos de forma melodiosa e
cadenciada, acompanhados de viola, como também fazem leituras ou declamações
muito empolgadas e animadas para conquistar os possíveis compradores. Para
reunir os expoentes deste gênero literário típico do Brasil, foi fundada em
1988 a Academia Brasileira de Literatura de Cordel, com sede no Rio de Janeiro.
Os folhetos à venda, pendurados em cordéis
História
A
história da literatura de cordel começa com o romanceiro do Renascimento, quando se iniciou impressão de relatos tradicionalmente orais feitos pelos trovadores medievais, e desenvolve-se até à Idade Contemporânea. O nome cordel está ligado à
forma de comercialização desses folhetos em Portugal, onde eram pendurados em cordões, chamados de
cordéis. Inicialmente, eles também continham peças de teatro, como as de autoria de Gil Vicente (1465-1536). Foram os portugueses que introduziram
o cordel no Brasil desde o início da colonização.
Evolução no Brasil
Na
segunda metade do século XIX começaram as impressões de
folhetos brasileiros, com suas características próprias. Os temas incluem fatos
do cotidiano, episódios históricos, lendas, temas
religiosos, entre muitos outros. As façanhas do cangaceiro Lampião (Virgulino
Ferreira da Silva,
1900-1938) e o suicídio do presidente Getúlio Vargas (1883-1954) são alguns dos assuntos de cordéis que
tiveram maior tiragem no passado. Não há limite para a criação de temas dos
folhetos. Praticamente todo e qualquer assunto pode virar cordel nas mãos de um
poeta competente.
No Brasil, a literatura de cordel é produção típica do Nordeste, sobretudo nos estados de Pernambuco, da Paraíba, do Rio Grande do Norte e do Ceará. Costumava ser vendida em mercados e feiras pelos
próprios autores. Hoje também se faz presente em outros Estados, como Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo. O cordel hoje é vendido em feiras culturais,
casas de cultura, livrarias e nas apresentações dos cordelistas.
O grande
mestre de Pombal, Leandro Gomes de Barros, que nos emprestou régua e
compasso para a produção da literatura de cordel, foi de extrema sinceridade
quando afirmou na peleja de Riachão com o Diabo, escrita e editada em 1899:
"Esta
peleja que fiz
não foi por mim inventada, um velho daquela época
a tem ainda gravada
minhas aqui são as rimas
exceto elas, mais nada''".
não foi por mim inventada, um velho daquela época
a tem ainda gravada
minhas aqui são as rimas
exceto elas, mais nada''".
Oriunda
de Portugal, a literatura de cordel chegou no balaio e no coração dos nossos
colonizadores, instalando-se na Bahia e mais precisamente em Salvador. Dali se
irradiou para os demais estados do Nordeste. A pergunta que mais inquieta e
intriga os nossos pesquisadores é "Por que exatamente no Nordeste?".
A resposta não está distante do raciocínio livre nem dos domínios da razão. A
primeira capital da nação foi Salvador, ponto de convergência natural de todas
as culturas, permanecendo assim até 1763, quando foi transferida para o Rio de
Janeiro.
Na
indagação dos pesquisadores, no entanto há lógica, porque os poetas de bancada
ou de gabinete, como ficaram conhecidos os autores da literatura de cordel,
demoraram a emergir do seio bom da terra natal. Mais tarde, por volta de 1750 é
que apareceram os primeiros vates da literatura de cordel oral. Engatinhando e
sem nome, depois de relativo longo período, a literatura de cordel recebeu o
batismo de poesia popular.
Foram
esses bardos do improviso os precursores da literatura de cordel escrita. Os
registros são muito vagos, sem consistência confiável, de repentistas ou
violeiros antes de Manoel Riachão ou Mergulhão, mas Leandro Gomes de Barros, nascido no dia 19 de novembro
de 1865, teria escrito a peleja de Manoel Riachão com o Diabo, em fins do século passado.
Sua
afirmação, na última estrofe desta peleja (ver em detalhe) é um rico documento,
pois evidencia a não contemporaneidade do Riachão com o rei dos autores da
literatura de cordel. Ele nos dá um amplo sentido de longa distância ao
afirmar: "Um velho daquela época a tem ainda gravada".
Os poetas
Leandro Gomes de Barros (1865-1918) e João Martins de Athayde (1880-1959) estão entre os
principais autores do passado.
Carlos
Drummond de Andrade,
reconhecido como um dos maiores poetas brasileiros do século XX, assim definiu,
certa feita, a literatura de cordel: "A poesia de cordel é uma das
manifestações mais puras do espírito inventivo, do senso de humor e da
capacidade crítica do povo brasileiro, em suas camadas
Modestas
do interior. O poeta cordelista exprime com felicidade aquilo que seus
companheiros de vida e de classe econômica sentem realmente. A espontaneidade e
graça dessas criações fazem com que o leitor urbano, mais sofisticado, lhes
dedique interesse, despertando ainda a pesquisa e análise de eruditos
Universitários.
É esta, pois, uma poesia de confraternização social que alcança uma grande área
de sensibilidade".
A
literatura de cordel apresenta vários aspectos interessantes e dignos de
destaque:
- As suas gravuras, chamadas xilogravuras, representam um importante espólio do imaginário popular;
- Pelo fato de funcionar como divulgadora da arte do cotidiano, das tradições populares e dos autores locais (lembre-se a vitalidade deste gênero ainda no nordeste do Brasil), a literatura de cordel é de inestimável importância na manutenção das identidades locais e das tradições literárias regionais, contribuindo para a perpetuação do folclore brasileiro;
- Pelo fato de poderem ser lidas em sessões públicas e de atingirem um número elevado de exemplares distribuídos, ajudam na disseminação de hábitos de leitura e lutam contra o analfabetismo;
- A tipologia de assuntos que cobrem, crítica social e política e textos de opinião, elevam a literatura de cordel ao estandarte de obras de teor didático e educativo.
Narrativa
Os textos
considerados romances na literatura de cordel possuem
alguns traços em comum quanto à sua narrativa. Os recursos narrativos mais utilizados nesses
cordéis são as descrições dos personagens em cena e os monólogos com queixas, súplicas, rogos e preces por parte do
protagonista.
São
histórias que têm como ponto central uma problemática a ser resolvida através
de inteligência e astúcia para atingir um objetivo. No romance romântico, a
problemática envolve elementos relacionados ao imaginário europeu – duques, condes, castelos –, apropriados e
adaptados pela literatura oral brasileira.
O herói sofrerá, vivendo em desgraça e martírio, sempre
fiel ao seu amor ou às suas convicções, mesmo com as intempéries. É comum a
intriga envolver jovens que enfrentam problemas na escolha de seus
companheiros, em relações familiares extremamente hierarquizadas. Objeção,
proibição do namoro, noivados arranjados são algumas das dificuldades que
impedem o jovem casal apaixonado de ficar junto ao longo do romance.
Ao fim de
tudo, o herói será exaltado e os opositores humilhados. Se assim não for,
haverá outro meio de equilibrar a situação, que durante quase toda a narrativa
permaneceu desfavorável ao protagonista.
Poética
Trabalho
de alunos, praça em Cerqueira César Quadra
Estrofe
de quatro versos. A quadra iniciou o cordel, mas hoje não é mais utilizada
pelos cordelistas. Porém as estrofes de quatro versos ainda são muito
utilizadas em outros estilos de poesia sertaneja, como a matuta, a caipira, a
embolada, entre outros.
A quadra
é mais usada com sete sílabas. Obrigatoriamente tem que haver rima em dois
versos (linhas). Cada poeta tem seu estilo. Um usa rimar a segunda com a
quarta. Exemplo:
Minha terra tem palmeiras
Onde canta o sabiá (2)
As aves que aqui gorjeiam
Não gorjeiam como lá (4).
Outro
prefere rimar todas as linhas, alternando ou saltando. Pode ser a primeira com
a terceira e a segunda com a quarta, ou a primeira com a quarta e a segunda com
a terceira. Vejamos estes exemplos de Zé da Luz:
E nesta constante lida
Na luta de vida e morte
O sertão é a própria vida
Do sertanejo do Norte
Três muié, três irimã,
Três cachorra da mulesta
Eu vi nun dia de festa
No lugar Puxinanã.
Sextilha
É a mais
conhecida. Estrofe ou estância de seis versos. Estrofe de seis versos de sete
sílabas, com o segundo, o quarto e o sexto rimados; verso de seis pés,
colcheia, repente. Estilo muito usado nas cantorias, onde os cantadores fazem
alusão a qualquer tema ou evento e usando o ritmo de baião. Exemplo:
Quem inventou esse "S"
Com que se escreve saudade
Foi o mesmo que inventou
O "F" da falsidade
E o mesmo que fez o "I"
Da minha infelicidade
Septilha
Estrofe
(rara) de sete versos; setena (de sete em sete). Estilo muito usado por Zé Limeira, o Poeta do Absurdo.
Eu me chamo Zé Limeira
Da Paraíba falada
Cantando nas escrituras
Saudando o pai da coaiada
A lua branca alumia
Jesus, Jose e Maria
Três anjos na farinhada.
Napoleão era um
Bom capitão de navio
Sofria de tosse braba
No tempo que era sadio,
Foi poeta e demagogo
Numa coivara de fogo
Morreu tremendo de frio.
Na
septilha usa-se o estilo de rimar os segundo, quarto e sétimo versos e o quinto
com o sexto, podendo deixar livres o primeiro e o terceiro.
Oitava
Estrofe
ou estância (grupo de versos que apresentam, comumente, sentido completo) de oito
versos: oito-pés-em-quadrão. Oitavas-a-quadrão. Como o nome já sugere, a oitava
é composta de oito versos (duas quadras), com sete sílabas. A rima na oitava
difere das outras. O poeta usa rimar a primeira com a segunda e terceira, a
quarta com a quinta e oitava e a sexta com a sétima.
Quadrão
Oitava na
poesia popular, cantada, na qual os três primeiros versos rimam entre si, o
quarto com o oitavo, e o quinto, o sexto e o sétimo também entre si.
Todas as
estrofes são encerradas com o verso: Nos oito pés a quadrão. Vejamos versos de
uma contaria entre José Gonçalves e Zé Limeira: - (AAABBCCB)
Gonçalves:
Eu canto com Zé Limeira
Rei dos vates do Teixeira
Nesta noite prazenteira
Da lua sob o clarão
Sentindo no coração
A alegria deste canto *
Por isso é que eu canto tanto *
NOS OITO PÉS A QUADRÃO
Limeira:
Eu sou Zé Limeira e tanto
Cantando por todo canto
Frei Damião já é santo
Dizendo a santa missão
Espinhaço e gangão
Batata de fim de rama *
Remédio de velho é cama *
NOS OITO PÉS A QUADRÃO.
Décima
Estrofe
de dez versos, com dez ou sete sílabas, cujo esquema rimático é, mais
comumente, ABBAACCDDC, empregada sobretudo na glosa dos motes, conquanto se use
igualmente nas pelejas e, com menos frequência, no corpo dos romances.
Geralmente
nas pelejas é dado um mote para que os violeiros se desdobrem sobre o mesmo.
Vejamos e exemplo com José Alves Sobrinho e Zé Limeira:
- Mote:
VOCÊ HOJE ME PAGA O QUE TEM FEITO
COM OS POETAS MAIS FRACOS DO QUE
EU.
- Sobrinho:
Vou lhe avisar agora Zé Limeira <A
Dizem que quem avisa amigo é >B
Vou lhe amarrar agora a mão e o
pé >B
E lhe atirar naquela capoeira <A
Pra você não dizer tanta besteira <A
Nesta noite em que Deus nos
acolheu >C
Você hoje se esquece que nasceu >C
E se lembra que eu sou bom e
perfeito >D
Você hoje me paga o que tem feito >D
Com os poetas mais fracos do que
eu. >C
- Zé Limeira:
Mais de trinta da sua qualistria
Não me faz eu correr nem ter
sobrosso
Eu agarro a tacaca no pescoço
E carrego pra minha freguesia
Viva João, viva Zé, viva Maria
Viva a lua que o rato não lambeu
Viva o rato que a lua não roeu
Zé Limeira só canta desse jeito
Você hoje me paga o que tem feito
Com os poetas mais fracos do que
eu.
Martelo
Estrofe
composta de decassílabos, muito usada nos versos heroicos ou mais satíricos,
nos desafios. Os martelos mais empregados são o gabinete e o agalopado.
Martelo agalopado - Estrofe de dez versos
decassílabos, de toada violenta, improvisada pelos cantadores sertanejos nos
seus desafios.
Martelo
de seis pés, galope - Estrofe de seis versos decassilábicos. Também se diz
apenas agalopado.
Galope
à beira-mar
Estrofe
de 10 versos hendecassílabos (que tem 11 sílabas), com o mesmo esquema rímico
da décima clássica, e que finda com o verso "cantando galope na beira do
mar" ou variações dele. Termina, sempre, com a palavra "mar".
Às vezes,
porém, o primeiro, o segundo, o quinto e o sexto versos da estrofe são
heptassílabos, e o refrão é "meu galope à beira-mar". É considerado o
mais difícil gênero da cantoria nordestina, obrigatoriamente tônicas as
segunda, quinta, oitava e décima primeira sílabas.
Sobrinho:
Provo que eu sou navegador romântico
Deixando o sertão para ir ao mirífico
Mar que tanto adoro e que é o Pacífico
Entrando depois pelas águas do Atlântico
E nesse passeio de rumo oceânico
Eu quero nos mares viver e sonhar
Bonitas sereias desejo pescar
Trazê-las na mão pra Raimundo Rolim
Pra mim e pra ele, pra ele e pra mim
Cantando galope na beira do mar.
·
Limeira:
Eu sou Zé Limeira, caboclo do mato
Capando carneiro no cerco do bode
Não gosto de feme que vai no pagode
O gato fareja no rastro do rato
Carcaça de besta, suvaco de pato
Jumento, raposa, cancão e preá
Sertão, Pernambuco, Sergipe e Pará
Pará, Pernambuco, Sergipe e
Sertão
Dom Pedro Segundo de sela e gibão
Cantando galope na beira do mar.
Redondilha
- Antigamente, quadra de versos de sete sílabas, na qual rimava o primeiro com o quarto e o segundo com o terceiro, seguindo o esquema abba.
- Hoje, verso de cinco ou de sete sílabas, respectivamente redondilha menor e redondilha maior.
Carretilha
Literatura
popular brasileira - Décima
de redondilhas menores rimadas na mesma disposição da décima clássica;
miudinha, parcela, parcela-de-dez.
Temas para pesquisar
O que é Cordel?
Capas de
cordel com aulas sobre movimentos literários no Brasil
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